José estava com o coração dolorido. Certas lembranças teimavam em ocupar a sua mente e coração. Havia também muitas perguntas sem resposta. Ele olhava ao seu redor e percebia que tudo estava começando a funcionar novamente. Mais gente na rua, nas praças, nos restaurantes, na sua igreja… As aulas dos filhos voltaram a ser presenciais. Seu chefe lhe disse que ele poderia continuar trabalhando home office, se desejasse… Ele preferiu voltar ao escritório. Disseram-lhe que que seria impossível voltar à realidade que ele conhecia antes, que agora todos teriam que aprender a viver o “novo normal”.
Para José adaptar-se ao novo normal era “o de menos”. Usar máscara diariamente por mais alguns meses, abster-se de abraçar os amigos, continuar usando álcool em gel, participar de mais uma reunião on line. Tudo isso era muito fácil para ele.
Difícil mesmo era viver sem a sua companheira. Sua fiel companheira de 25 anos de casados se foi para sempre. Aquela que ele viu sair de casa com suspeita de estar com covid e nunca pôde tocar, abraçar, beijar e fazer aquele carinho habitual.
Foi tudo muito rápido. Desde o primeiro dia em que ela esteve internada foi uma agonia extrema. Faleceu em apenas 18 dias. Ele não pôde se despedir e não teve forças para ir ao cemitério. Seu coração foi tomado por uma tristeza sem fim…
A última vez que ele pôde dizer para sua querida esposa: “Eu te amo!” foi em março do ano passado. Já se passou quase um ano e meio. E agora? A dor lá no fundo da alma continua sendo muito real e há dias em que parece ainda maior…
José se aproxima de Deus e pergunta: “Meu Pai, ainda posso chorar?”
Ele está com dúvidas. Disseram-lhe para ser forte. Quando criança aprendeu que “homem não chora”. Mas ele chorou. Chorou escondido, quando estava tomando banho, na calada da noite… Ele queria continuar chorando. Mas será que já não era o tempo de parar de se lamentar e chorar? Por este motivo ele fez esta pergunta: “Meu Pai, ainda posso chorar?”
O Pai Celestial o tomou no colo. Pediu ao Espírito Consolador para lhe falar baixinho ao ouvido: “É claro que sim, meu filho! Você pode chorar”. E o Filho lhe relembrou o que Ele havia ensinado quando esteve aqui na terra: “Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados.” (Mateus 5:4)
A dor de um luto pode não durar apenas alguns meses. É “normal” sentir uma dor tão profunda, uma saudade imensa que se transforma em lágrimas… Não existe um prazo fixo para experimentar este tipo de dor. Para muitos dentre nós é ainda tempo de chorar.
José experimentou alívio quando recebeu esta mensagem do Deus Trino e chorou mais uma vez. Chorou não apenas de dor, mas também de gratidão por perceber o amor do Deus em quem Ele sempre confiou.
Deus nos dá não apenas permissão para chorar, mas até mesmo nos estimula a não negar ou esconder a nossa dor. Por que deveríamos fazer diferente? Por que não acatar a dor do outro? Por que não se mostrar mais sensível?
Que os que continuam sofrendo – e não são poucos -, mesmo sem verbalizarem a pergunta: “Ainda posso chorar?”, percebam em nossa postura acolhedora a mesma resposta que recebemos de Deus: “Sim, você pode chorar.”
Marcos Vieira Monteiro